segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

O desafio social da profissionalização em tempos de mudança

Tendo em vista a ampliação e legitimação crescente de seus resultados, as organizações e movimentos da sociedade civil vêm sendo desafiados a se profissionalizar, por meio da estruturação, do fortalecimento, da sistematização e do aprimoramento dos seguintes processos básicos ou dimensões transversais de funcionamento:

- Práticas de gestão e planejamento;
- Estratégias de atuação comunitária;
- Sistemas de monitoramento e avaliação;
- Capacidades de parceria e articulação;
- Poder de influência em espaços públicos;
- Mecanismos de sustentabilidade financeira.

Tais aspectos compõem o tema abrangente do desenvolvimento institucional, que ainda não recebe a devida atenção por parte de muitas entidades e atores sociais, acostumados que estavam, muitas vezes, a receber financiamentos com maior facilidade, disponibilidade e liberdade para gastá-los onde, quando e como achassem mais convenientes.

No entanto, os tempos mudaram e as responsabilidades também. As organizações não-governamentais consolidaram-se e difundiram-se, no Brasil e no mundo, como agentes fundamentais e imprescindíveis para a solução dos problemas sociais, ambientais e culturais cada vez mais complexos e desafiadores que afetam grande parte da humanidade.

O enfrentamento desses desafios e a construção de alternativas, evidentemente, requerem a participação conjunta, permanente e diferenciada dos demais setores organizados, que incluem o investimento dos governos, a colaboração das empresas, a cooperação das universidades, a representação dos partidos e o amparo das instituições multilaterais.

Mudar o mundo! Esse é o lema maior que inspira e aglutina uma multidão de profissionais, militantes e voluntários que não aceitam e se reconhecem no tipo de sociedade egoísta, violenta, insensível e excessivamente competitiva que impera entre nós e ameaça nosso futuro comum. Combater as desigualdades, preconceitos e injustiças de toda ordem! Essa é (ou deveria ser), em última instância, a razão de ser das associações civis, fundações privadas, entidades religiosas e cooperativas solidárias que integramos ou conhecemos.

Começamos falando da necessidade de profissionalização social e de repente paramos na questão da missão da sociedade organizada frente às crises do planeta, cujo caos se reflete no cotidiano do nosso bairro, da nossa comunidade e às vezes dentro do próprio lar. Isso foi para ajudar a mostrar que não há contradição entre sermos organizados e sermos indignados, entre zelarmos pela gestão interna e cuidarmos da atuação externa.

Pelo contrário, o desenvolvimento técnico-institucional e a militância sócio-ambiental devem caminhar de mãos dadas e passos firmes. As competências executivas (que alguns chamam equivocadamente de burocracia) e as lutas políticas (que às vezes não passam de interesses eleitoreiros) podem e devem buscar – sempre – eliminar seus aparentes antagonismos, partilhar seus sonhos, somar suas forças e multiplicar seus impactos.

BLOG Vencer Juntos
"Mudando o mundo com você"

domingo, 21 de fevereiro de 2010

O dilema sadio do profissionalismo x militância

Um dilema ronda todo ambiente organizacional das ONGs. Devemos ser mais profissionais ou mais militantes? Nenhum ator social escapa ileso dessa dicotomia. No entanto, é preciso atenuar a gravidade da questão, relativizando posições radicalizadas e condutas irredutíveis. Ambas as dimensões, necessariamente, coexistem nas organizações e repercutem, em graus variados e oscilantes, na trajetória comportamental de cada pessoal.

Para fins didáticos, é interessante distinguir os atributos típicos desses dois perfis: enquanto os profissionais evidenciam características técnicas, racionais e previsíveis; os militantes põem em relevo aspectos políticos, emocionais e instáveis. O primeiro, por se preocupar mais com condições objetivas e padrões mensuráveis, tende a ser mais detalhista e cauteloso em suas intervenções. Já o segundo, por focalizar seu olhar em torno de processos de mudança e disputas ideológicas, acaba sendo mais generalista e ousado em suas empreitadas.

As pessoas que lidam diretamente com as comunidades e populações devem fazer prevalecer seu lado militante, inclusive para que suas palavras e mobilizações possam tocar o coração e atingir mais facilmente a consciência dos públicos abordados e parceiros acionados. Afinal, é preciso falar a língua de tais grupos, demonstrar atitudes inspiradoras, conquistar sua confiança e engajá-los para abraçar as causas com as quais se identificam.

Por sua vez, as pessoas que atuam no interior da organização, no âmbito técnico ou administrativo, são instadas a cultivar um maior rigor profissional, em função mesmo da natureza das tarefas sistemáticas que lhes cabem executar. Sem menosprezar sua parcela de idealismo, a burocracia operacional que pauta suas rotinas de trabalho já é suficientemente grande para atrair sua atenção, direcionar suas energias e consumir seu tempo.

Uma organização social que se preze não pode descartar dois ingredientes essenciais: paixão e resultados. Agir sem sentido, sem tesão, sem visão, acabaria por esvaziar e até matar a alma social da instituição. Ao mesmo tempo, atuar sem prazos, sem regras, sem controles, terminaria por instalar o caos, minando qualquer possibilidade mínima de gestão e sacrificando com o passar do tempo sua capacidade efetiva de funcionamento.

Dilemas, todo mundo (e suas organizações) tem, mas alguns deles existem para o bem. E o verdadeiro dilema profissionalismo x militância é honrosamente um deles. Retirá-lo dos debates ventilados pela sociedade civil é, no mínimo, “partidarizar” um universo que só encontra harmonia quando pluralmente regido pelas duas forças vitais referidas: a paixão, para mudar os cenários desafiadores que enfrentamos; e os resultados, para garantir que nossos esforços estejam sempre avançando no terreno perceptível da realidade.

BLOG Vencer Juntos
"A mudança só depende de nós"
Planejar liberta mais do que aprisiona

Planejar para que, se tudo muda? Quem planeja de mais, executa de menos. O futuro jamais pode ser enquadrado em uma caixinha rígida de metas, responsáveis e prazos. Os investimentos em planejamento engessam a flexibilidade e inibem a criatividade. Não adianta planejar aquilo que não podemos controlar. Não conseguimos planejar nem nossa própria vida individual, quanto mais uma organização coletiva.

O parágrafo acima é um prato cheio para quem tem alergia a planejamento. Mas vou logo alertando os gulosos por tais aforismos, candidatos crônicos ao anarquismo profissional: planejar não ofende e é muito mais saudável do que insistir no contrário. O melhor planejamento pode não ser a ponte inevitável para o sucesso esperado. Mas a ausência de planos é o passaporte certo para resultados medíocres.

Quem se deixa levar pela incerteza, torna-se míope para os detalhes da caminhada. Quando não sabemos bem para onde vamos, nosso olhar se perde nas atribulações imediatas do cotidiano. Sem visão, nossa ação perde dimensão. Sem direção estratégica, nossos caminhos operacionais se estreitam demais, podendo nos levar a lugar nenhum, ou nos tanger para destinos equivocados e frustrantes.

O planejamento, por mais paradoxal que seja, liberta muito mais do que aprisiona. Planejar não é vestir camisa de força. Planejar é usar a liberdade de forma produtiva. É ter um guia para antecipar ameaças antes que causem estragos maiores. É ter uma bússola para fisgar oportunidades antes que sejam capturadas por radares mais preparados e sensíveis às variáveis ambientais e eventos externos.

Qual a sua vocação no mundo? Qual seu papel na sociedade? Qual a missão de sua organização? Sua entidade conhece a dinâmica que influencia sua existência? As ações empreendidas em sua instituição estão articuladas dentro de um projeto estruturado, claro, coerente, viável e monitorável? Ampliando a escala desse “checklist”: Os projetos de sua organização apontam para um horizonte comum, capaz de unificar seus grupos em prol de uma causa mais abrangente?

O planejamento não foi “inventado” para ser executado cegamente. Mais do que traçar mapas com distâncias, percursos e fronteiras imutáveis, o planejamento nos ajuda a enxergar além, aguçando nossos sentidos para acontecimentos quase invisíveis, que gostam de se esconder dos peregrinos incautos e só se desnudam para quem tem olhos de águia. A questão não é simplesmente saber quando choverá ou fará sol, mas como lidar melhor com ambos os fenômenos, na hora em que aconteçam.

BLOG Vencer Juntos
"A mudança só depende de nós"